CURSOS LIVRES
Pulsão Crip: de tempos em tempos, um monstro ataca de surpresa
Rodrigo Vaz
Como bem coloca Costa (2021) em resenha da obra “Pragmatismo pulsional”, de João Perci Schiavon (2019), a pulsão é um dizer, é uma vida desconhecida, uma afirmação primordial e, por princípio, uma entidade de fronteira atravessando planos e sendo ela mesma de consistência ética, ao exigir estratégias psíquicas e culturais à altura de seus desafios.
Isso se torna tarefa árdua, pois, como colocam Dri Azevedo (2022) e Karl Posso (2009), em diálogo com Julia Kristeva (1982), quando uma vida não é arauto de um cronograma corponormativo nem exerce cumplicidade com a identidade familiar (cisheterossexista), esta (vida) representa a ameaça da sujeira, do lixo corpóreo, do abjeto como aquilo que perturba a identidade e a ordem.
Sendo assim, a proposta do curso aponta para a instauração de mostruários clínicos como denúncia e presentificação da estranheza. Quem é o monstro, afinal? Questão que recuperamos de Freud a partir do conceito de “unheimlich, situado precisamente na ideia de estranho e sinistro, pois invoca a definição de Schelling, conforme Freud (1996, p. 242), ao afirmar “ser ameaçadoramente estranho aquilo que deveria ter permanecido oculto e se tornou evidente.”
O corpo inesperado de ume analista crip, parafraseando Rosemarie Garland-Thomson (apud SILVERA, 2018), desencadeia ansiedades impensáveis que investigam os contornos e os limites do que tomamos como humano. De acordo com Jack Halberstam (2020), para os queers/crip, a falha pode ser um estilo. Para tanto, construiremos também durante o curso pistas para uma clínica camp.
Em referência a Susan Sontag (1996), Dri Azevedo (2022) definirá o camp como uma gargalhada social por meio de um esgotamento explosivo de energia, e também como esbanjamento de energia pela extravagância de um estilo, desafiando binarismos. É a encarnação de uma “seriedade fracassada”, complementa Sontag (1996), um “demasiado” por fissurar cronogramas corponormativos e da diferença sexual, por transgredir e romper cotidianamente com frames sufocantes que violentam e matam.
Rodrigo de Oliveira Feitosa Vaz: psicólogue clinique, ator-performer e escritor(e), bicha não binárie, pessoa com deficiência. Graduade em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba (2011), mestre em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2015) e pós-graduande em Psicanálise e Relações de Gênero: Ética, Clínica e Política pelo Instituto de Pesquisa em Psicanálise e Relações de Gênero. Compõe o Coletivo Não Binárie da Paraíba e o Corpo Clínico do Projeto Aquendando Afetos: Saúde Mental para Pessoas Trans. Presta assessoria em escrita acadêmica e literária e publicou o livro de contos “Máquina de Escrever” (2018), pela Editora Kazuá.
Karen Horney: psicanálise e feminismos entre a destruição e o devir
Turma 2
Larissa Ramos da Silva
Karen Horney foi uma pioneira da psicanálise que, embora pouco estudada no Brasil, produziu importantes críticas consideradas feministas ainda na década de 1920, abrindo o campo de diálogos/embates/divergências/entrelaçamentos entre psicanálise e feminismos. Você já ouviu falar dela na sua formação? Quais as contribuições da autora para uma escuta clínica psicanalítica feminista? Quais os principais conceitos produzidos pela autora? Qual a sua relevância para o nosso tempo? Tudo isso e muito mais! Vem com a gente.
Karen Horney foi uma pioneira da psicanálise que, embora pouco estudada no Brasil, produziu importantes críticas consideradas feministas ainda na década de 1920, abrindo o campo de diálogos/ embates/ divergências/ entrelaçamentos entre psicanálise e feminismos.
Neste curso, teremos como objetivo conhecer essa autora e suas principais contribuições para as articulações entre psicanálise e feminismos, colocando sua produção em diálogo com discussões contemporâneas. A partir disso, poderemos não apenas ressignificar a história da psicanálise, tal como nos é contada tradicionalmente, mas também resgatar contribuições importantes para a teoria e a clínica hoje.
Larissa Ramos da silva é psicóloga. Mestra em psicanálise: clínica e cultura pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Atua clinicamente em consultório particular e pesquisa nas interlocuções entre psicanálise, estudos de gênero e feminismos.
A Psicanálise Frente à Questão Identitária
Turma 2
Eduardo Leal Cunha
Pretendemos aprofundar a discussão sobre o lugar das identidades na teoria e na clínica psicanalítica, tomando como ponto de partida o debate contemporâneo e os enfrentamentos entre a psicanálise e os movimentos identitários, sobretudo aqueles organizados em torno de gênero e raça. Para tanto partiremos de uma breve cartografia crítica desse debate para em seguida propor a noção de racionalidade identitária, modo de pensar que, a partir da modernidade ordena a relação consigo mesmo e com o outro, sustentando a identidade tanto como forma hegemônica da experiência subjetiva quanto como elemento central da luta política contemporânea. É a partir da consideração dessa racionalidade que recolocaremos a discussão sobre o lugar das identidades na teoria e na clínica psicanalíticas
A identidade se apresenta hoje como elemento central da luta política e também como forma hegemônica de autoenunciação e de afirmação de si. Diante disso, o movimento psicanalítico parece oscilar entre: de um lado, a negação do seu valor como categoria de análise ou mesmo como ferramenta estratégica na relação com o outro, desqualificando assim os ditos movimentos identitários, frequentemente associados ao neoliberalismo e a um individualismo radical que negaria o pacto coletivo; e, do outro lado, a adesão quase incondicional ao uso da identidade como função psicológica indispensável ao bem estar individual. Nos posicionando neste debate, procuraremos explorar formas de lidar com a afirmação das identidades na clínica psicanalítica contemporânea, sem reduzir nossa compreensão da experiência subjetiva à dimensão identitária nem, por outro lado, negar sua importância central na experiência contemporânea, em particular na articulação entre os processos de estruturação subjetiva e a realidade social e política.
Eduardo Leal Cunha é Baiano de Salvador, 58 anos, é psicólogo formado pela Universidade Federal da Bahia, com Mestrado em Teoria Psicanalítica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Doutorado em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Desde 2005 na Universidade Federal de Sergipe, é atualmente Professor Titular, tendo sido Chefe do Departamento de Psicologia e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Realizou Estágio Doutoral na Universidade Federal do Rio de Janeiro, na Universidade de São Paulo e na Universidade de Paris - Cité, na qual integra, desde 2016, o quadro de Pesquisadores Associados, vinculado ao Centro de Pesquisas Psicanálise, Medicina e Sociedade. Foi professor visitante da Universidad Los Andes, Colômbia, e da Universidade de Paris VII - Diderot. Atuou, ainda, como Professor Convidado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Escola de Comunicação da UFRJ e no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo. É membro da Rede Interamericana de Pesquisas em Psicanálise e Política e do Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos. É autor de: O que aprender com as transidentidades: psicanálise, gênero e política (Criação Humana 2021); O político e o íntimo: subjetivação e política, do impeachment à pandemia (Devires, 2021); Indivíduo singular plural: a identidade em questão. (7Letras, 2009) e O adultério em dez lições (Planeta, 2004), além da ficção Humedad (Bogotá, La Jaula, 2017). Como organizador, é corresponsável, dentre outras, pelas coletâneas: Psicanálise, gênero, fronteiras (Devires, 2024); A vida depois das mortes: elaborações psicanalíticas da pandemia (Devires, 2023); Faces contemporâneas da razão (Concern, 2018) e A fabricação do Humano (Zagodoni, 2014), esta última vencedora de um Prêmio Jabuti.
O Luto e a violência em Judith Butler: as relações de poder na vida precária
Ana Laura Arnhold
Ao apresentar o luto como um processo que manifesta a brevidade e precariedade da vida, Judith Butler pensa a finitude, a morte e a perda como algo comum dos seres humanos e que, em teoria, deveria gerar aproximação e empatia.
Porém, a autora elabora argumentos que demonstram que o luto só é validado se a vida perdida for considerada de fato, uma vida.
Por isso, questiona-se: Quais vidas estão aptas a produzir luto? Como os determinantes sociais, culturais, raciais e de gênero (des)favorecem a produção da vida enlutável?
A obra de Judith Butler é pertinente na compreensão das condições da vulnerabilidade da vida humana, e nas relações de poder que permeiam a produção do luto.
É necessário reconhecer que a vida e a morte são sentidas e vividas de formas diferentes, não só pelo sujeito enlutado, mas pela sociedade que pode produzir luto por alguns, e por outros não.
Por isso, é importante compreender de que forma são conduzidas as relações de poder que determinam se uma vida é enlutável ou abjeta.
Ana Laura Arnhold: Doutoranda e Mestra em Educação nas Ciências (UNIJUÍ), Especialista em A moderna Educação (PUCRS), Bacharela e Licenciada em Ciências Biológicas (UNIJUÍ).
É bolsista CAPES e atua como pesquisadora na área de gênero e feminismo; participa do projeto de pesquisa “Por uma educação da “não violência” dos corpos: políticas-digitais feministas vão à escola e à universidade” vinculado à FAPERGS.
@analauraarnhold
"Não aceito mais as coisas que não posso mudar, estou mudando as coisas que não posso aceitar" - Angela Davis
Onira Dan Dará Yuri Tripodi
No que consiste esse diálogo?
Expandir pontos do maravilhoso texto-manifesto do IPPERG para uma compreensão prática de qual clínica desejamos nos implicar. Já no título, frase de uma ativista preta e comunista, já podemos lançar nosso olhar para a compreensão de uma clínica plural, que combate as opressões, coimplicada socialmente e de caráter não adaptativo; uma clínica que almeja a transformação pessoal, política e estrutural, na qual sua base ético-política está na produção de subjetividades insubmissas, insurrecionárias, não dóceis.
O que iremos nos propor a analisar? Como construir uma escuta ativa e que não reproduza silenciamentos e inaudibilidades em múltiplas questões, uma escuta íntegra e que colabore para a transformação íntima e política dos problemas apresentados.
Como o capitalismo se apropria de algumas questões contemporâneas, ao exemplo de representatividade para alçar melhores condições de vida para uma parcela ínfima, deixando sujeitos do mesmo grupo social destes últimos favorecidos ainda marginalizados, superexplorados, em uma ação concreta de necropolítica (Achille Mbembe); por isso a necessidade de uma mudança estrutural, sistêmica – falaremos um pouco da China e como essa sociedade socialista erradicou a extrema pobreza e tirou 850 milhões de pessoas do mapa da fome.
Porque trabalhar com esse tipo de clínica atualmente? É necessário que a escuta analítica esteja cada vez mais alinhada a uma perspectiva não enrijecida em padrões de distanciamento e apreensão teóricas. Urge uma voz tanto do analista como do analisando que leve em consideração questões de raça, gênero, classe, sexualidade, neurodivergência, deficiência e interseccionalidade e como os dilemas recorrentes das diferentes subjetividades possam ter acolhimento e potência de promoção de mudanças em muitas esferas.
Trazemos aqui, contrapondo processos institucionais, a ideia do confidente, do interlocutor, mais do que a do profissional e(m) seu divã. As análises do inconsciente serão de suma importância para essa clínica que, como nos provoca Deleuze e Guattari, ‘buscamos inconscientes que protestam e precisamos de aliados’.
É artista e pesquisadora. Soma em sua produções Performances, VideoArtes, VideoDanças, Teatro Experimental, Interferências Urbanas, Situações, Proposições Comportamentais etc.
Autora do livro 'O Corpo da Loucura na contemporaneidade: um Manifesto autoetnográfico'. Ativista e Militante em favor dos Neurodireitos e no Combate à PSICOFOBIA.
Dentre seus experimentos, podemos citar 'Bikini Quadradão' (2014), 'Ul-traje para Ocasiões Fúnebres' (2014), 'Sintáxi Pra Paripe' (2014), 'P&B - Experimento sob cano e papel' (2014), 'Guerra de Espadas' (2015), 'Poroso' (2016), 'Sociedade 100 Escolas' (2017), 'Se Jesus Cristo morresse nos dias de hoje com Ética, em toda Coroa ao invés de espinhos, passaria uma corrente elétrica' (2018), 'À Força que vem da Raiz' (2020), 'AVANÇO DESMASCARA(N)DO' (2021), 'Softway of Destruction' (2017).